sábado, 28 de junho de 2008

Uma festa para São Sebastião



Juliana Boechat - Estagiágia do Correio Braziliense

Os 15 anos comemorados hoje por São Sebastião contam apenas uma parte da história da comunidade. Na década de 1950, o local englobava as fazendas Taboquinha, Papuda e Paranoá e era povoado pelos escravos da sinhá Luzia, dona do engenho, conhecida como Velha Papuda. No meio do cerrado, encontravam-se guilhotinas, lugares de penitência e grande produção rural. Quase 60 anos depois, São Sebastião, a Região Administrativa 14 (RA 14), a 26km de Brasília, virou uma cidade independente, livre para crescer além de seus atuais 100 mil habitantes, e hoje tem muito a comemorar. A festa de aniversário começa às 8h30 e termina às 17h, com apresentações de grupos musicais e o corte do bolo de 15m.

Segundo o administrador da cidade, Josino Alves da Costa, São Sebastião deu um grande passo quando recebeu uma gestão própria, em 1993. Padeiro, Josino mora na região há 25 anos e comemora as últimas conquistas do lugar: “Ganhamos canalização da rede de esgoto, um Tribunal de Justiça e em breve os lotes terão escritura”. Para o futuro, uma visão otimista: “São Sebastião ainda é uma menina. Vamos aproveitar essa fase e nos preocupar com necessidades futuras”. A cidade receberá uma estação da Companhia energética de Brasília e a esperança é que indústrias procurem se instalar na região.

Mas nada disso poderia ser comemorado hoje se não fosse a coragem de Sebastião de Azevedo Rodrigues, 65 anos, que deu nome à cidade. Ele chegou à região em 1959 em um pau-de-arara (caminhão que transportava migrantes do Nordeste e de outras regiões para Brasília, Rio e São Paulo, entre outras cidades) vindo de Patos de Minas (MG) com mais sete pessoas de nome Sebastião para trabalhar nas olarias e produzir os tijolos usados na construção de Brasília.

O começo
Sebastião de Azevedo tirava areia, matéria-prima dos tijolos, do Rio São Bartolomeu. Por isso, recebeu o apelido de Tião Areia. No início da década de 60, muitas olarias foram abandonadas e quem havia chegado ao Planalto Central em busca de emprego ficou sem trabalho. Foi então que Tião passou a coordenar a sua própria olaria. Em pouco tempo, era a pessoa mais rica da cidade. “Eu tinha 22 caminhões, sete olarias, e três máquinas de carregar areia. Isso era muita coisa”, lembra orgulhoso. Mas por volta dos 40 anos, Tião descobriu que estava com doença de Chagas e foi informado pelo médico que a morte era inevitável.

Com a mudança brusca dos planos, Tião Areia tomou uma decisão: “Eu era muito rico e ia morrer. Então resolvi ajudar os outros”. A partir de então, distribuiu espaços de terra vazios na região para amigos e familiares. Ele construiu casas de alvenaria para as pessoas mais carentes e buscou moradores de outras regiões para povoar a atual São Sebastião. Logo, o que hoje é o centro da cidade se transformou em uma pequena comunidade com 72 casas construídas por ele. “O problema é que eu não morri”, brinca Tião, que se curou com medicamentos naturais. Então ele continuou a ajudar as pessoas.

Orgulho
A primeira esposa de Tião, Maria Silva Rodrigues, 58 anos, acompanhou de perto a trajetória do ex-marido. Juntos, construíram e cuidaram do posto de saúde, da creche e conseguiram a iluminação para as casas. Quando recebeu a notícia de que ia morrer, Tião passou todos os bens para Maria. Até hoje, ela mora em frente à Praça Tião Areia, no centro da cidade, em uma casa com um grande quintal e espaço para receber os 10 filhos e 22 netos que teve ao longo da vida. “É muito bom ver a nossa cidade como está hoje”, orgulha-se.

Tião foi obrigado a deixar a antiga casa, logo na entrada da cidade. Enquanto espera o novo lote, vive em uma casa de um cômodo, com duas camas, uma mesa de plástico e homenagens presas na parede. “Estão fazendo suspense, mas acho que o lote vai ser perto da minha praça”, imagina. Ele gosta de mostrar o Morro da Cruz, com um cruzeiro construído pelos escravos. O fundador vê, de cima, a cidade que começou a construir. Ele costumava ir ao local pedir a Deus namoradas e chuvas na época da seca. Hoje, ele agradece a saúde e a coragem que teve ao longo dos anos. “Fico orgulhoso em ver as coisas como estão atualmente, os ônibus cheios chegando e saindo da cidade no início e no fim do dia. Antigamente não tinha nada. Não me arrependo de nada”, garante.

São Sebastião é uma região com estilo de cidade de interior. É afastada de lugares movimentados e localizada entre morros. Ali, o comércio começa a se desenvolver, ruas aos poucos são asfaltadas e instituições chegam à cidade, como é o caso do Tribunal de Justiça. Cerca de 47% da população tem menos de 20 anos e a maioria trabalha em outras localidades. Em São Sebastião, tudo é perto. As pessoas andam a pé ou de bicicleta e todo mundo se conhece. E uma de suas marcas humanas é a hospitalidade. “Todo mundo é bem recebido aqui”, diz Tião, com simplicidade.

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